Operação Asfixia fiscaliza ferro-velho em Icaraí e prende dono do local
Ferro-velhos clandestinos seguem operando em Niterói mesmo após interdições: entraves legais e reincidência desafiam poder público
Apesar de sucessivas interdições, a operação Asfixia — realizada pela Prefeitura de Niterói em parceria com forças de segurança — voltou a flagrar, nesta segunda-feira (2), a atividade criminosa em um ferro-velho clandestino no Morro do Cavalão, em Icaraí. O local, já interditado anteriormente, foi novamente alvo de fiscalização, desta vez com a apreensão de hidrômetros, bicas metálicas e um caminhão usado para transportar materiais furtados. O proprietário foi preso por desobediência.
O caso escancara uma falha estrutural: por que imóveis usados reiteradamente em crimes continuam operando, em vez de serem interditados de forma definitiva ou desapropriados?
Entraves legais impedem resposta mais firme
A legislação brasileira permite a desapropriação por interesse público ou mesmo a perda de bens utilizados reiteradamente para fins ilícitos. No entanto, esses processos dependem de provas robustas, judicialização, perícia técnica e direito ao contraditório. Mesmo em flagrantes de crime, o imóvel muitas vezes não pertence ao autuado diretamente, o que dificulta a responsabilização patrimonial.
Por isso, na maioria dos casos, as autoridades se limitam à interdição administrativa — medida temporária, muitas vezes desrespeitada pelos envolvidos. A falta de instrumentos legais ágeis e específicos para reincidência em crime patrimonial urbano acaba esvaziando a eficácia da fiscalização.
Um ciclo que se repete
Este é o segundo flagrante no mesmo imóvel em apenas um mês. Na última operação, foram apreendidas 13 máquinas de jogo ilegal, bombas de água, cabos de cobre, bicicletas e motocicletas com sinais de roubo. Mesmo com essas evidências, o local voltou a operar normalmente — demonstrando como a fragilidade da resposta institucional acaba permitindo a continuidade das atividades ilícitas.
Outros bairros também têm sido palco da mesma dinâmica. Operações anteriores da chamada “Operação Asfixia” fiscalizaram ferros-velhos na Região Oceânica, Barreto, Fonseca e Engenhoca. Em quase todos, foram registradas autuações por irregularidades, apreensões e prisões — sem que isso resultasse em retirada definitiva do imóvel da atividade criminosa.
Impactos diretos nos serviços públicos
A apreensão de hidrômetros — equipamento essencial para o abastecimento de água — chama atenção para o impacto que esse tipo de atividade causa diretamente nos serviços públicos. A comercialização ilegal de itens furtados alimenta uma cadeia que prejudica residências, equipamentos urbanos e compromete a segurança da população.
Quem são os verdadeiros responsáveis?
Outra camada de opacidade dificulta a resolução do problema: muitos imóveis estão registrados em nome de terceiros ou operam por meio de laranjas, dificultando o rastreamento da cadeia patrimonial e judicial. A ausência de um cadastro urbano integrado e atualizado também dificulta medidas de responsabilização efetiva.
O que poderia ser feito?
Entre as alternativas previstas em lei, estão:
- Ações de perda de bem (art. 91, II, do Código Penal), com base no uso reiterado do imóvel em crimes;
- Desapropriação-sanção (Estatuto da Cidade), por descumprimento da função social da propriedade;
- Execução de multas fiscais reincidentes, que podem levar à penhora e leilão do bem;
- Imissão na posse com finalidade pública ou social, em casos graves de comprometimento urbano.
Todas essas alternativas exigem não apenas aparato jurídico, mas também articulação política, vontade administrativa e atuação integrada com o Poder Judiciário.
O solo urbano como campo de disputa
A persistência desses pontos ilegais revela um problema mais profundo: a disputa pelo uso do solo urbano entre o interesse público e a lógica do crime organizado. A falta de resposta estrutural e patrimonial ao problema permite que imóveis reincidentes continuem alimentando furtos, receptação e insegurança, ainda que com interdições e operações pontuais.
A Prefeitura afirma que a Operação Asfixia continuará atuando de forma ostensiva. No entanto, especialistas alertam que sem medidas de ruptura, como a desmobilização jurídica definitiva dos imóveis usados para fins ilícitos, as ações tendem a apenas postergar o problema.
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